“Depois a trágica retirada para o jazigo ou cova,
E depois o princípio de morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido…
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia…
Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
Quando faz anos que nasceste, quando que faz anos que morreste;
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.”
In Poesia de Álvaro de Campos Vol. I, Fernando Pessoa, PLANETA DEAGOSTINI
Caros Malditos e leitores aspirantes a malditos,
Já há um largo período de tempo que não exponho neste nosso blogue as minhas palavras, que dizem alguns, serem de uma sabedoria natural. Mas não creio em tal. Comecei este meu post com um poema de Álvaro de Campos, poema esse que eu tenho uma admiração especial, pois é difícil encontrar uma definição de morte melhor do que a de Álvaro de Campos.
A morte é um processo lento e gradual, e não como nós aprendemos a paragem do funcionamento do tronco cerebral (é apenas o inicio). Consiste então numa queda no esquecimento principalmente por parte daqueles que nos amam.
Mas porque estou eu a falar de morte? Simplesmente porque nos últimos tempos, comecei a pensar mais nesta questão, e no sentido da vida. E cheguei à conclusão que o sentido da vida reside no objectivo de morrer realizado. Mas como podemos então sentirmo-nos realizados, quando não temos uma pessoa do nosso lado a apoiar, com a sua força, com a sua vontade de viver, de crescer, de amar, de encantar? Temos de procurar essa pessoa, que alguns dizem ser a nossa cara metade… Pode acontecer que tenhamos encontrado essa pessoa, e nunca tivemos coragem para lhe dizer, com um receio certo de ouvir um não. Talvez as palavras que sempre desejamos dizer são palavras proibidas. O seguinte excerto da música “Vontade de Mudar”, dos Madredeus, traduz o que eu digo.
“Pobre, de quem não tem
De quem não tem ninguém
E sonham que nunca é tarde
Quando encontrar alguém”
Isto é mais um dos meus devaneios, assumindo-me no papel de entidades distintas de mim, e reflectindo sobre as suas vidas, vivências, sentimentos e relações. É difícil viver na angústia de uma solidão rodeada de gente. Não tenho mais palavras…
Ubirajara Piatã © PD