sexta-feira, 25 de março de 2011

Possível topografia dos lugares interiores #33

33. o homem que nos pedia para dizer trinta e três.


O biombo arrastado
quase de todo o tamanho
fechava-nos o espaço
e o homem pedia:
- diga trinta e três.

Se me ouvia
mais do que eu sabia
a ignorância era a minha,
e o tórax escavado
às vezes acanhado,
respondia, envergonhado:
- trinta e três.

Os anos que se condensaram
nas escavações do meu peito
fizeram-me crer em algum jeito
ou até algum secreto desígnio
de ser eu o meu próprio sacrifício
e aceitar a vulnerabilidade
dos que se apresentando frágeis
deixam a minha vulnerabilidade
reencontrar neles a integridade
e para isso eu peço hoje:
- diga trinta e três.



Hermenegildo Espinoza

domingo, 20 de março de 2011

Imagiologia (quase) médica #17




your heart is a hummingbird



Hermenegildo Espinoza

terça-feira, 15 de março de 2011

Possível topografia dos lugares interiores #32

32. as horas perdidas nas filas de cafeína.


Colhidos por um bocejo de tédio,
achocalham-se logo as moedas
para no intervalo ir recuperar o médio
ânimo que se nos escapa pelas goelas.

As horas sem taxa nessas filas de espera,
o dedo na ranhura logo a seleccionar o açúcar
que, sendo muito amigo das canas de esmera,
salva-nos amiúde do desencontro de escutar.

Para onde iremos depois exercitar a paciência
ou alguns momentos de mútua sociedade?
Equacionar a caféina na sua elegante cadência
de menina, em bicos de pés, dona da sua idade.





Hermenegildo Espinoza

domingo, 13 de março de 2011

Epitáfios para um médico de algibeira VII

/Dizias: um dia dançarás para mim, um dia cuidarás de mim, um dia estarás lá para me ver morrer. Falavas só das tuas certezas: eu dancei para ti, eu cuidei de ti e, por fim, morreste, mas a medicina não morreu em ti./




Hermenegildo Espinoza

sábado, 5 de março de 2011

Possível topografia dos lugares interiores #31

31. os amores fado-resistentes.


O metacarpo não se verga à dor,
à dor da falta de outra concavidade,
onde se enterram a saudade, o fado
e as ternuras sussuradas em acordes de colibri.

O bom metacarpo, aliás, não vive da inveja
que outros servem fria como condimento,
se nos esquecermos das letras desse diálogo:
coragem! – a resistência é um rotineiro embalo.

Alguém que se assemelhe a um verso de melancolia,
não sabe a associação humana destes ossos moles,
só a lembrança de não desanimar em frente ao Grotesco
que há dias em que utiliza a nossa fotografia de infância.




Hermenegildo Espinoza

quarta-feira, 2 de março de 2011

Cadáver
s. m.

1. Corpo morto.
2. Fig. Pessoa tão fraca ou doente
que parece estar
para morrer.
3. Coisa que parece
aniquilada de todo
.


in
diciomaginário