quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Declaração de interesses: vinho do Porto, roupão azul, gatos literários, barba por aparar, the long and winding road, enfim, 2011

Amanhã, por volta da meia-noite, rotineiramente, pegarei numa cadeira da cozinha, ficarei sentado na quietude da noite da varanda, um copo de vinho do Porto no regaço, com o leitor de mp3 escondido no roupão azul e, mesmo antes do primeiro rebentar do fogo, carregarei no play, só para que novo ano não me apanhe desprevenido na corrida dos anos, enquanto vou dedilhando no ar as notas de um piano etéreo, acompanhado pela orquestra dos meus gatos. Depois arranharei a barba - dizem as más-línguas - idêntica à que o Paul McCartney exibia quando, em 1970, já a separação habitava os olhos deles os quatro. Para já, não revejo na minha barba qualquer premonição. Deixai-a sosegada. Bom ano.




Hermenegildo Espinoza

sábado, 25 de dezembro de 2010

Possível topografia dos lugares interiores #25

25. o cordão umbilical e os andaimes babilónicos.


Dois nus começaram a humanidade,
adiantam alguns, que ainda acrescentam
os pecados que esses dois nus incutiram ao futuro.

Na alegria da nossa criação, em todos os credos,
retemos um cordão que nos liga e possui a geleia
que nutriu as multidões dum bipedismo propulsor
do mal e do bem, da chama de petróleo em candeia.
(E a humanidade canta, no meio do frio do orvalho:
- aproveita, camarada, e traz outro amigo também).

Tanto em Belém, Berlim, Buenos Aires,
até mesmo Freixo-de-Espada-à-Cinta,
nasce um menino, nascerá sempre,
que traz camuflados nos genes
os andaimes babilónicos de humanização.





Hermenegildo Espinoza

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Gira-discos #32

B Fachada - Dia de Natal


Um dia este será o senhor barbudo que os nossos filhos tomarão como o senhor que também nos encantou um dia.






Hermenegildo Espinoza

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Gira-discos #31

Linda Martini - Cronófago

Já houve um tempo em que o tempo não me vinha comer os calcanhares,
nem a pressa de viver vinha aligeirar as frieiras das mãos,
tornando o meu corpo frio,
- São os carris, os carris que nos prendem aqui,
Onde tudo é igual,
quase tão rápido como a vez
em que experimentámos deixar de respirar,
em que a ausência de sopro foi um século vazio,
- São os carris, esses malditos carris que nos prendem aqui,
Ao pé de ti, ao pé de ti, ao pé de ti, ao pé de ti, o lugar de onde fugi.


(esta velha casa, onde tudo é igual)




Hermenegildo Espinoza

sábado, 18 de dezembro de 2010

Apneia
(a- + -pneia)

s. f.
1. Asfixia.

2. Por ext.
Respiração excessivamente ténue.

in
diciomaginário


quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Possível topografia dos lugares interiores #24

24. as rimas de néon arterial.


Penduradas nas casas, descaídas sobre a rua,
deparamo-nos com vastas artérias a vencer as veias
tão pequenas nas noites com este dominó de candeias
a deslumbrar-nos com mais do que uma visão crua.

Encarnado a soprar no breu da avenida,
o casaco esconde mais do que o calor do corpo:
são espectáculos de luz recta em espectador torto,
ecos de uma estância ininterrupta e foragida.

Fiquem a saber que nestas rimas de néon arterial
somos todos um soldadinho de chumbo imperial.




Hermenegildo Espinoza

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

domingo, 12 de dezembro de 2010

Gira-discos #30

Travis - Selfish Jean

Tem a palavra o vídeo.




Hermenegildo Espinoza

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Epitáfios para um médico de algibeira III

/Quem não se cumpriu em rigor mais do que quem se ausentou em vontade, não se pode auto-responsabilizar por ineficácia. Contudo, o médico sem responsabilidade não é médico. E o médico que não recicla, diariamente, a sua responsabilidade é um João Semana sem bondade, para os outros e para si./






Hermenegildo Espinoza

domingo, 5 de dezembro de 2010

Pausa. Rewind. Play.



Não sei se é da voz se é da batida, mas há um certo compasso melódico e nostálgico que me faz querer comprar um gira discos e voltar ao século passado. E metê-lo numa sala onde tenha uma lareira. Sala essa incluída num 16º andar em Paris. Ah e com vista para a Tour Eiffel, num dia frio com neve nas ruas.
Carago, como eu me enconstava para trás no sofá dessa sala a saborear um whisky velho com a prespectiva dessa torre a espelhar os sonhos de uma vida e um crepitar aconchegador a acompanhar a Françoise Hardy.
Para já, vou voltar a terra e vestir a manga caviada para acabar o dia com masturbação psicológica em protesto pela mudança dos tempos.

B.S.

Possível topografia dos lugares interiores #23

23. as crianças com pseudópodes nas falanges.


O frio do círculo polar árctico
impõe, dizem-nos, o recolhimento,
mas, até ver, os dedos das crianças
têm acarinhado muitas expansões.

De modo a principiar a escultura do medo
as falanges das crianças são duras como cascos,
quanto muito sabem ferir-se por descuido,
ou não fosse o descuido o catalisador da perfeição.

Vão errando as crianças, com as falanges a prolongar-se
por intermináveis erros, palpando quanto podem:
sinais salientes e marcas da destruição maldosa,
mesmo que avisadas vão pelas suas aventuras
esfolando as falanges dos dedos estirados.
O mundo, reitere-se, é mesmo delas.




Hermenegildo Espinoza

Imagiologia (quase) médica #15

De que somos feitos por dentro?

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Anastomose
s. f.
Anat.
Ponto de junção de dois vasos ou canais.

in
diciomaginário