sábado, 22 de agosto de 2009

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Estive para vir aqui falar da derrocada que matou cinco pessoas numa praia do Algarve - conhecido pelo seu exímio ordenamento do território. Uma derrocada que vitimou uma família inteira (quatro das cinco pessoas falecidas eram do Porto: pai, mãe e duas filhas).
Estive para vir aqui falar da derrota do Sporting, há momentos, com o Braga, onde nem o xuxu da Luciana Abreu salvou os lagartos da derrota. Mal sabe o garoto do Djaló que ao chegar a casa lá terá de a aturar: "ó mor, estão tãooo confusa!". Rezemos, então, pelo bem do rapaz e de todas as outras criancinhas.
Estive para vir aqui falar do meu país, onde uma rapariga vítima de violação tem de esperar 12 horas para ser vista por um perito de medicina legal, num dos maiores e melhores hospitais do país que ainda está na ressaca de várias cegueiras por explicar. Num país onde um normal médico de serviço, na impossibilidade do aparecimento do perito, poderia ter feito a recolha das amostras, mesmo sem a melhor qualidade, sempre poderia poupar o desgaste psicológico de um esticar de horas de humilhação, desamparo e trauma.
Estive para vir aqui dizer que abundam os dias de desilusão com o meu país. Este cantinho tão grande na História do Mundo como o conhecemos. Continuamos, julgo, no estatuto de país empreendedor e solidário, contudo, a identidade foi-se esmorecendo. Somos agora uma imagem baça da nitidez que éramos. Essencial é incutir nas crianças-que-aí-vêm que o puxão de orelhas da História permanece, hoje, o melhor aviso para erguer a nação.
Estive para vir aqui falar mal do meu país, pedir que rezássemos pelo Djaló e destilar todos os meus actuais ódios. Estive para vir aqui fazer tanta coisa. Acabei por não fazer nada. Talvez eu mesmo seja também um retrato do meu (nosso) país.



"O Povo completo será aquele que tiver reunido no seu máximo todas as qualidades e todos os defeitos. Coragem Portugueses, só vos faltam as qualidades."

Almada Negreiros, no Ultimatum Futurista.



Hermenegildo Espinoza

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