41. todos sabemos chorar sem o pedir.
Alguém viu no espelho um vulto
de um menino metido consigo,
e logo esse alguém pediu:
- abre as asas, rapaz -
mas do solo o menino não descolou
no solo nenhuma pena caiu,
e teve o rapaz o acesso de bondade
de nos contemplar do alto da sua meninice
naquela posicão anatómica descritiva
de quem pode chorar sem o pedir.
Não tinha sombra, não tinha rosto,
um vulto não tem anatomia, tem suposições,
e alguém disse num tom cuidadoso:
- daqui não avançamos mais -
e viu-se invertido ao espelho
teve medo das suas feições de criatura
e também não teve necessidade de pedir.
Num atlas de anatomia actualizado
apareceu por cima um espelho de bolso
todo ele numa nitidez húmida
e uma pena fustigada pelo vento:
tão belo era esse prefácio da descrição
de quem pode chorar sem o pedir.
Hermenegildo Espinoza
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