"- Mãe?
- Sim, filha...
- Porque é que ele está sempre parado a fazer aquilo?
- Está a pensar em coisas dele, filhota!
- A fazer aquilo?
- É a maneira dele, amor.
- Ele nunca brinca, como eu...
- Ele prefere brincar sozinho, só isso... Vá, lava as mãos e vamos lanchar!
- Hum, está bem...! Quero leite com chocol (...)"
O resto deduzem.
"Ele" - Pronome pessoal, palavra indefinida e baça, susceptível a ser personalizada por um qualquer, o qual poderá estar a ser identificado por um dedo apontado a si.
Nada que nos tire o sono.
O que nos "perturba" é o que ele está de facto a fazer. Desconhecemos a sua vida, o tipo de pessoa que é, a necessidade de apoio que necessita ou o grau de socialização da sua pessoa. "Ele". Tão simples quanto isso, apreender a sua acção com um olhar observador e inquisidor, franzir o sobrolho face ao sucedido, ponderar rapidamente, achar uma explicação lógica para o sucedido, ter pena do dito cujo e da familia - se a tiver -, sentir o pesar da consciência por um momento e a vontade de sermos bons, encolher os ombros no momento seguinte e prosseguir a nossa vida convictos de que no fundo somos sortudos e podemos aproveitar a vida mais sensíveis que nunca para com os outros e certamente mais abertos à caridade. Mas não dura mais de 3 dias. 3 míseros dias depois de vermos a reportagem, lermos o artigo, presenciarmos ao vivo, o que quer que seja, já lá vai. Acaba o período de Catarse e voltamos à velha rotina facilitista dos nossos dias.
"Ele" não. De facto, nem nota a maior parte das vezes; e se o faz trata de categoricamente transparecer um desinteresse tal que é como se não tivesse em verdade notado. Pouco se importa com olhares repreendedores dos que o não compreendem ou penosos dos que o sabem. Em nada se interessa pelo frio da sua própria baba escorrida ou pelos hematomas que a si causa. Classificado como doente pela sociedade, chumba leis que desconhece e implementa os limites do seu próprio mundo. "Ele" é assim mesmo. Inacessível, talvez, mas há quem diga, feliz.
Caminha diaramente pelos olhares contemporâneos, que assume fantasmagóricos ou sombrios por conseguir ver através deles, de quem o rotule de oligofrénico, de coitado, de vesado. No seu campo de visão contempla, pelo contrário... Hum... Sabe-se lá o quê!
Quimeras gregas que interpelam o pato Donald numa colina erguida acima do vale enublado de onde pormete erguer-se "O Desejado" cavalgando um dinossauro que tenha 3 cabeças, jurando paz aos Infiéis; Todas as estações, apeadeiros, quilómetros de percurso, sinais, matrículas de carros, de motos, marcas, modelos ou componentes mecânicos. Raciocínios matemáticos tão complicados que desafiem e lógica humana e derrubem a teoria de Einstein ou expliquem passo a passo a formação do Sistema Solar como nunca antes ninguém o fez.
Como sabê-lo, no entanto? Não há maneira certa de lhes retirar o que quer que seja. Mundo deturpado, uma ditadura implementada e controlada por ditadores da sua própria palavra e do grau de abertura aos que se dizem "normais". Mas "Eles" não o são, não. Não se interessam por o ser, também. De facto, e reconcluindo, não se interessam por nada. Sofredoras, amarguradas familias que já não esperam o reconhecimento ou a amostra do carinho espontâneo de um filho pródigo que nunca há-de regressar a casa, pelo menos neste mundo que materializamos à nossa imagem.
Havia quem falasse de um Quinto Império, havia quem pusesse um D. Sebastião a cavalagar numa outra direcção - brindo à saúde do poeta -, mas como iluminar a estrada dos que a não vêm?
Havia quem conquistasse, em tempos, Terras Prometidas e desafiasse exércitos para expandir fronteiras, mas como nos aliarmos a "Eles" para a luta contra um inimigo invisivel?
A derradeira questão: " - Nós compreendemo-los, mamã?", " - Ninguém os compreende, querida!"
Façam o favor de nunca baixar os braços.
Identificar quem são, no geral, os "eles" é já, por si só, um bom indício de que em parte nos tornamos próximos de os compreender.
Bachiatari Sensei
Sem comentários:
Enviar um comentário